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Especialistas defendem novo modelo previdenciário híbrido e criação de programa nacional de renda mínima para enfrentar envelhecimento populacional, informalidade e rombo fiscal - Foto: Ilustração |
O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) está em uma encruzilhada fiscal e estrutural que ameaça a sustentabilidade da previdência pública no Brasil. Com um déficit anual estimado em R$ 350 bilhões, segundo dados do Tesouro Nacional de 2023, o sistema previdenciário brasileiro dá sinais de esgotamento diante das mudanças demográficas, econômicas e sociais do país.
“É como carregar um peso que não para de crescer”, afirma o advogado Sysley Sampaio de Araújo, mestre em Direito pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP). A população brasileira está envelhecendo em ritmo acelerado — com previsão de que o número de idosos dobre até 2050, conforme o IBGE (2024) — e 39% da força de trabalho encontra-se na informalidade, conforme aponta a PNAD Contínua deste ano.
Um dos dados mais preocupantes é que aproximadamente 50% dos beneficiários do INSS jamais contribuíram para o sistema. Isso porque o modelo atual mescla previdência contributiva com assistência social, o que, segundo juristas, gera distorções severas. “É injusto com quem trabalha e contribui todo mês”, critica a advogada Alline Guimarães Marques, também mestre pelo IDP e especialista em Direito Público.
Apenas as aposentadorias rurais e o Benefício de Prestação Continuada (BPC) consomem R$ 230 bilhões anuais dos cofres públicos, muitas vezes destinados a pessoas que nunca recolheram ao sistema. Em um contexto em que a dívida bruta brasileira alcança 78% do PIB (FMI, 2024), esse desequilíbrio compromete a capacidade do Estado de investir em áreas estratégicas como saúde, educação e habitação.
Proposta de transição: modelo híbrido e renda mínima
Para enfrentar o colapso anunciado, especialistas propõem uma reforma estruturante, com a migração para um modelo previdenciário híbrido. Inspirado em países como Suécia e Austrália, o novo modelo combinaria contribuições obrigatórias com fundos privados regulados, garantindo cobertura ampla e sustentabilidade a longo prazo.
Os benefícios assistenciais, por sua vez, seriam incorporados ao Bolsa Família, criando o Programa Nacional de Renda Mínima (PNRM). Esse programa garantiria um valor de R$ 1.640 mensais, corrigido pela inflação, voltado especialmente aos trabalhadores informais. “Essa é uma forma de promover justiça social com responsabilidade fiscal”, defende Sysley.
A transição seria financiada por um Fundo de Transição Previdenciária (FTP), com blindagem constitucional (art. 60, §4º, da Constituição) e múltiplas fontes de receita, como créditos de carbono (R$ 5 bilhões por ano, Banco Mundial, 2023) e excedentes fiscais (R$ 10 bilhões por ano, Ministério da Fazenda, 2024). Com projeções de crescimento do PIB em 2,5% ao ano, o fundo poderia acumular R$ 12 trilhões até 2055, zerando o déficit previdenciário e liberando recursos para outras políticas públicas.
Lições internacionais e base legal brasileira
A proposta se apoia em lições internacionais. A Suécia implementou uma reforma gradual entre 1994 e 2010, equilibrando longevidade e informalidade. A Austrália assegura 95% de seus trabalhadores com fundos regulados. Já o Chile serve como exemplo do que não fazer: sua reforma mal conduzida deixou cerca de 40% dos informais desprotegidos em 2019.
No plano jurídico, a Constituição Federal (art. 194) prevê um sistema baseado na universalidade da cobertura e na equidade na forma de participação. O Supremo Tribunal Federal (STF) também já reafirmou que a dignidade da pessoa humana deve ser o pilar central das políticas públicas (RE 626.489/SP, Rel. Min. Roberto Barroso, 2013).
A proposta inclui ainda medidas de inclusão produtiva, como microcrédito e qualificação profissional, com 10% da arrecadação do FTP destinados a apoiar a transição de trabalhadores informais para o mercado formal, nos moldes do modelo australiano.
A reforma do INSS, mais do que uma necessidade fiscal, torna-se uma urgência social. O futuro da previdência brasileira depende de escolhas estruturadas, responsáveis e baseadas em justiça intergeracional.
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